quinta-feira, 20 de maio de 2010

Memórias do Elísio (Suspiros...)

Especialmente para quem é um romântico incurável como eu, vai aí a poesia que me trouxe a prata no Sarau da PUC Minas 2009. Piegas demais, como diria uma amiga minha, no entanto, um pouco de piegalidade não faz mal a ninguém...

MEMÓRIAS DO ELÍSIO (SUSPIROS...)

Pela centésima vez
Meu desejo te alcança em uma mesma hora
E os momentos perfeitos organizam-se
Nos labirintos de meus pensamentos
Retomando o sonho eterno de outrora
O qual relembro ao mesmo tempo
Em que deixo fugir de meu coração
O milésimo suspiro dado desde aquele dia

E a cada suspiro, o presente volta ao passado
Meus sentidos retrocedem no tempo
Sujeitos ao poder das lembranças
Que marcaram minha alma com um fogo inextinguível

Nossos corpos entrelaçados como um só
Nosso paladar mesclado pelo ósculo
O suor sagrado ungindo nossas peles
Fruto do prazer etéreo e da união de nossas existências

Quem era eu?
Quem era você?
Eu não sabia...
Talvez estes nem mesmo existissem
E nossos nomes se perdessem
Na origem do novo ser que formávamos, chamado Nós
Ausentes do mundo e contidos no Paraíso
Onde nossas respirações sincronizadas eram as veias deste Elísio
Regendo a pulsação de duas almas gêmeas
Unificadas uma vez mais depois de vagar interminavelmente através do Tártaro
Finalmente, atingindo o ápice e a epítome do viver
Tocando a linha que separa o humano do divino
Realizamos a compreensão do mistério nomeado Amor

Recobro a percepção da realidade devagar
O reino dos sonhos se despede momentaneamente
Deixando como promessa de retorno
Pelos eriçados e um sorriso involuntário em meu semblante
Quando um arrepio súbito emerge de todos os meus músculos
E a ilusão de seu perfume próximo ainda vaga em meu inconsciente

O milésimo primeiro suspiro escapa...















Sário Ferreira - 27 de fevereiro de 2009

Crononemesia

Se esse ponteiro não parasse
Se essa saudade passasse
Se meu coração pastasse
Em seus campos brancos, seios da paz
Cerrados cá, nessa cadeia errônea
Se abrir eu pudesse
Tal cela mnemônica

Memento pontiagudo
Vil e sã lâmina que retalha
Em pedaços de veludo
A dura armadura da batalha
Que travo e destravo a cada olhar do rosto lunar
Findando em redundância a circular guerra por amar
Crono Nêmesis, por que tanta represália?
Cruéis setas retrocessas, oh! Durada batalha!

Se meu aliado tu fosses e me amasse para que mais eu pudesse amá-la
Se não tanto corresse pra nós quando desfrutamo-nos a sós
Se você não rastejasse quando o vão cheio de falta se instala
Se esse pranto impaciente e atroz sumisse com o ouvir de sua voz

Eis que seria o meio para o início de mais um dos fins

Um piscar de ventura no descartar da armadura
Trote milesimal em seus brancos campos brandos
Finitude dada por crônica e reta flecha certeira
E o infim recomeça, guerra eterna de fins tantos














Sário Ferreira – 08/04/2010

segunda-feira, 17 de maio de 2010

domingo, 9 de maio de 2010

Desgostos

Gosto de andar pelas ruas incautas e sentir que a insegurança nos assegura de que essa vida urbana é dura, que as chances boas estão em falta. Gosto das vastas distâncias sem fim que separam o idoso da saúde, desfiles de filas em filas alicerçadas pela ausência de atitude. Gosto de toda esta justiça justa, apertada, sem espaço para a massa atada, balança torta e bruta que assusta. Gosto de pagar pelo tudo e receber o nada acrescido ao seguinte brinde: a consciência de que sou outro heróico cidadão dominado pelo mesmo vilão. Gosto da saudade adiantada que vem se espalhando, do verde, do puro, do autêntico ouro, definhando em prol do falso tesouro, vil e vão, se acumulando. Gosto de nossa (Ausente!) educação, pois como já se dizia nos dias de alta filosofia: Bem-aventurados são os tolos, pois a ignorância é uma benção! Gosto do pensamento de que consigo gostar, já que atualmente tudo é indiferente, ninguém nada sente... Ou todos sentem o nada? Complexo como ver o desenho do ar... Gosto da sinfonia de buzinas orquestrada pela hora do pico, soando sobre rios estáticos de metal, em acordes de stress e uma pressa letal. É um grande espetáculo, há concerto mais rico? Gosto de apreciar a labuta vivida para se viver em labuta, enquanto se paga as parcelas do caro retrato, tudo por trás das cláusulas de um contrato. Eis o sentido da vida: se erguer e lutar para cair em outra luta. Mas o que eu mais gosto em tudo é falar às avessas... Você percebe agora, leitor, que caiu na arapuca de um ironista? Perdão se te iludo com essas cismas travessas, mas tudo me ignora, um horror, se eu sou sincero e simplista. Não me importa que desgoste de mim, após tal traição lhe encho de razão, mas se gostar desses meus gostos como eu gosto, novamente lhe direi, mas desta vez com gosto: Eu gosto deste leitor!

Sário Ferreira - 05 de maio de 2010


Escárnio

Prisão de carne
Mundo de desejos
Sujos cujos
Sussurros neblinam o ver
E lhe deixa a crer
Que não tem quem quer
Que não quer ter o quem
Quando o bestial e camaleônico querer
Aflora, estoura
Te separando de ser seu ser

Oh, amarga e doce dor de ver!
Ausente aos olhos
Presente do ardor

Tu resistes, amor?














Sário Ferreira