domingo, 21 de novembro de 2010

Desertório

Depois de um longo inverno, cá estou eu de novo, (re)tentando blogar algumas poesias e (ou) pretensas destas. Outro dia, já fazem meses, estava eu no trabalho, aprisionado no costumeiro escritório em que passo a parte mais densa de meus dias e semanas, quando, no meio das atividades rotineiras que lá realizo, brotou em mim uma incomum inspiração e em local mais incomum ainda... Aproveitei-me e, tomando o teclado em minhas mãos, atei-me ao caminho das palavras uma vez mais...

DESERTÓRIO

Preso na tela
O sono protela
Ileso esfarela
Deserto em remela

Ponteiros em sol
Apertam um nó
Retesa-me só
Faz o livre em pó

Assim, dez caminham
Passos repassados num chão
De poucas polegadas se vão
Um, cem, dez caminhos
Qual línqua pisoteada
Diz muito sem falar nada

Um nobre descoroado
Em móvel trono jaz
Sem súditos, sem paz
Em távola aprisionado
Onde corre fiel um rato
Rato preto, não teme gato

Sofrida travessia
Ida sem noite ou dia
Sol de calor que esfria
Em solitária companhia

Findam-se as areias
Decerto, o oásis amado
Ante lesadas veias
Deserto teu grão suado














Sário Ferreira

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Insaciável

Esse desejo fulguroso
Ardente e sincero
De possuir você por completo
Sem exceções mínimas ou máximas

De ter sua respiração
De ter seu olhar
De ter seus lábios em mim
De ter seu corpo
De ter seu coração
De ter sua alma comigo

Possuir você por completo
A razão do meu Ser encarnada
Sem exceções, máximas ou mínimas
Saciar essa vontade insaciável
Em uma eterna e prazerosa sina

Te ter até me perder
E ver que o que existe é você
Divina e lendária na minha mente
Materializando-se dos meus sonhos mitológicos

Desejo fulguroso
Me guiando até o fim da sanidade
Sincero e ardente
Engrenando meus suspiros
Ainda que o Apocalipse desfaça o mundo

Quanto mais minhas células gritam
Em dependência de ti
Mais me dou conta
De quanto me torno insaciável
De sua presença tranqüilizadora
E da imagem perfeita e clara
De um sonho realizado
Resumida em seu mais simples sorriso














Sário Ferreira, 16 de Dezembro de 2008

terça-feira, 22 de junho de 2010

Anjo de Artémis

Anjo que ascende, calma, do leito de Ártemis
Me deixe sonhar, no acalento de teu abrigo
Perfeito me acende, com ‘alma, o frio não temes
Posso sussurrar, ao vento aromal que trazes consigo?

De vasta ternura, o mar de um amar tão profundo perfaz
A raiz dos sentires, que florescem por dentro esse fascínio
Esplendida e rara, a forma sem forma ao meu mundo se traz
Reflexo de Eros, linhas que tecem o córdis com domínio

Ó, caminhante das estrelas, magnetiza-me como ímã ao ferro
Sete eternidades inteiras seriam finitas para te proclamar
E citar a grandeza da volição insaciável de ter-te muito além do te ter

Aqui, ante asas tão belas, recuso nomear tal ânsia como erro
Faz-se realidade sonheira, Elysiun sólido de suspirar
Não há tristeza ou aflição, Serafim de Ártemis, anjo do bem de meu ser












Sário Ferreira - 12/06/2009

Férias & tempo livre & agora... E agora?

A quanto tempo não sentia o sabor desse tempero chamado tempo livre... Ainda não consigo crer que estou conseguindo:

*Ler alguns de meus tantos livros que tanto me esperavam
*Ouvir música
*Jogar um ou outro jogo no PC
*Ler os blogs dos meus companheiros e companheiras de guerra no curso de letras
*Tocar minha até então empoeirada guitarra/violão até meus calos dos dedos se reinstalarem em seus devidos lugares
*Ficar à toa (Somente após a labuta diária de dez horas, é claro)
*Dormir mais cedo
*Escrever isso...

Todas essas atividades não deixavam de ser sonhos distantes, há umas 2 semanas atrás... mas agora cá estou, de férias e as férias estão de mim. É claro que o trabalho ainda interfere no descanso que eu realmente julgo merecer (o que, se realizado, me deixaria em coma para o resto da vida), mas esse pouco tempo que tenho está mais do que rendável... em dezembro sim terei férias totais, mas nem arrisco em pensar nesse futuro com tanto afinco, pois quanto mais rápido o tempo passa, mais rápido a vida passa junto. E aí vai uma dúvida filosófica inspirada pelo meu amigão Herbert Spencer: por que estamos sempre possuídos por esta sangria de querer matar o tempo, sendo que quanto mais veloz seu pavio queimar, mais breve será a duração das chamas de nossas vidas? Mesmo consciente sobre o fato de que matar o tempo poder ser considerado um sinistro desejo suicida, não consigo desviar desta sina carregada pela humanidade... O bom é apreciar cada átomo do pavio queimar, é se deliciar com o agora. E ao menos agora, quero aproveitar o agora, postando uma poesia... mas pena que o agora já passou e quando você ler, vai pensar que está lendo agora... mas este agora maledicto já passaste... Agora inalcançável, a compreensão do usufruto do viver está em você, e você inexiste... tal como o ínicio de um círculo que gira ao mesmo tempo em sentido oposto a seu próprio sentido.

Ainda fico louco por tentar encontrar alguma lucidez na realidade.


domingo, 13 de junho de 2010

Amor amo-te... Ah! Mar!

Dia dos namorados? Ah, que nada! A única data que foi importante ontem para mim foi meu 26º mêsversário de namoro! A poesia abaixo foi dedicada à minha musa inspiradora, chamada Suilan, e com sua permissão estou expondo mais esta minha tentativa de exercício literário... Para os apaixonados, creio que muita coisa do que há nesta prosa os trará uma sensação de identificação.

AMOR AMO-TE... AH! MAR!

Minha mente vaga flutua aqui e ali em oceanos límpidos, velejando, navegando em busca de qualquer arquipélago de palavras que farão a diferença e superarão o teor de todas as que eu já te disse desde o início de nossa jornada neste mar de rosas que ainda se perde no horizonte. Por que é tão difícil essas letras e palavras encontrar?

Me sinto tanto em alto mar que tudo que tenho em vista é contrário à concretidão de ilhas, é leve e espiritual, como o cheiro da brisa e o dança de um coral. Desculpe pela incapacidade, anjo, mas quanto mais convivo contigo mais vivo e menos digo, pois parece até desperdício, não, sacrifício, falar sem te beijar, e além do mais acho que se eu te beijar vou conseguir falar muito mais do que se eu lhe falar. Você é meu vício tornado em virtudes, a última pérola para essa ostra entre milhares.

Princesa, anjo, amor, agora sereia, dentre tantos nomes, você parece intimidar a língua falada, a língua escrita, até mesmo em seu poder de dar conceito ao mundo. A única língua que você não intimida, essa você instiga, é a minha língua, que é a sua língua, em nosso dialeto do amor, que fala sem falar. Perdido, perdido e mergulhado entre um cardume de sentimentos, essências abstratas, e uma procura impossível por um meio mundano de expressão destes. Perdido, perdido nessa vastidão de nomes e adjetivos repetidos (como o português é pequeno pra nós dois?), mas perdido, e perdido na alegria de te ter, de ter sido encontrado, encontrado e pescado pela sinceridade e simplicidade de seus olhos únicos, afiados como uma lâmina forjada na felicidade.



Sário Ferreira - 12/06/2010

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Recrescência

Há cerca de três meses lá estava eu, perdido de meu outro eu há quase três estações. A tinta constantemente saia da caneta, mas nenhuma gota era pra poesia, era para trabalho somente, e infelizmente não do trabalho para poesia... Mas foi então que, como uma profecia de Nostradamus, veio me o "insight" incontrolável necessitado de ser libertado do universo caótico de minha mente para a concretidão aprisionada do papel. Deixei-o voar nas pautas da folha, e o vento das ideias cantou a seguinte poesia sob suas asas:

RECRESCÊNCIA

Reles Alma, adiante se adianta
Em flora e grama, gramática jaz
Nas distantes ilhas lexicais
De triste fauna semântica extinta
Escravas senhoras de um senhor escravo
Mel que inexiste em uma colméia sem favo

Genuína semente em minha mente demente
Raiz seca, molha-te o suor impróprio
Procuro por vós, voz, fruto excelente
Pois as puras águas são só para o ópio
Caule increscente, chagado por todos
Morreu ao som de uma lira sem cordas

Mestr'ego, não chores, pois aqui neste broto
Recorda-se a lira, de acordes em chave
Vê cego e recresça em fogo envolto
Livra te d'ira, ganhe o céu vermelha ave












Sário Ferreira - 20/03/2010

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Memórias do Elísio (Suspiros...)

Especialmente para quem é um romântico incurável como eu, vai aí a poesia que me trouxe a prata no Sarau da PUC Minas 2009. Piegas demais, como diria uma amiga minha, no entanto, um pouco de piegalidade não faz mal a ninguém...

MEMÓRIAS DO ELÍSIO (SUSPIROS...)

Pela centésima vez
Meu desejo te alcança em uma mesma hora
E os momentos perfeitos organizam-se
Nos labirintos de meus pensamentos
Retomando o sonho eterno de outrora
O qual relembro ao mesmo tempo
Em que deixo fugir de meu coração
O milésimo suspiro dado desde aquele dia

E a cada suspiro, o presente volta ao passado
Meus sentidos retrocedem no tempo
Sujeitos ao poder das lembranças
Que marcaram minha alma com um fogo inextinguível

Nossos corpos entrelaçados como um só
Nosso paladar mesclado pelo ósculo
O suor sagrado ungindo nossas peles
Fruto do prazer etéreo e da união de nossas existências

Quem era eu?
Quem era você?
Eu não sabia...
Talvez estes nem mesmo existissem
E nossos nomes se perdessem
Na origem do novo ser que formávamos, chamado Nós
Ausentes do mundo e contidos no Paraíso
Onde nossas respirações sincronizadas eram as veias deste Elísio
Regendo a pulsação de duas almas gêmeas
Unificadas uma vez mais depois de vagar interminavelmente através do Tártaro
Finalmente, atingindo o ápice e a epítome do viver
Tocando a linha que separa o humano do divino
Realizamos a compreensão do mistério nomeado Amor

Recobro a percepção da realidade devagar
O reino dos sonhos se despede momentaneamente
Deixando como promessa de retorno
Pelos eriçados e um sorriso involuntário em meu semblante
Quando um arrepio súbito emerge de todos os meus músculos
E a ilusão de seu perfume próximo ainda vaga em meu inconsciente

O milésimo primeiro suspiro escapa...















Sário Ferreira - 27 de fevereiro de 2009

Crononemesia

Se esse ponteiro não parasse
Se essa saudade passasse
Se meu coração pastasse
Em seus campos brancos, seios da paz
Cerrados cá, nessa cadeia errônea
Se abrir eu pudesse
Tal cela mnemônica

Memento pontiagudo
Vil e sã lâmina que retalha
Em pedaços de veludo
A dura armadura da batalha
Que travo e destravo a cada olhar do rosto lunar
Findando em redundância a circular guerra por amar
Crono Nêmesis, por que tanta represália?
Cruéis setas retrocessas, oh! Durada batalha!

Se meu aliado tu fosses e me amasse para que mais eu pudesse amá-la
Se não tanto corresse pra nós quando desfrutamo-nos a sós
Se você não rastejasse quando o vão cheio de falta se instala
Se esse pranto impaciente e atroz sumisse com o ouvir de sua voz

Eis que seria o meio para o início de mais um dos fins

Um piscar de ventura no descartar da armadura
Trote milesimal em seus brancos campos brandos
Finitude dada por crônica e reta flecha certeira
E o infim recomeça, guerra eterna de fins tantos














Sário Ferreira – 08/04/2010

segunda-feira, 17 de maio de 2010

domingo, 9 de maio de 2010

Desgostos

Gosto de andar pelas ruas incautas e sentir que a insegurança nos assegura de que essa vida urbana é dura, que as chances boas estão em falta. Gosto das vastas distâncias sem fim que separam o idoso da saúde, desfiles de filas em filas alicerçadas pela ausência de atitude. Gosto de toda esta justiça justa, apertada, sem espaço para a massa atada, balança torta e bruta que assusta. Gosto de pagar pelo tudo e receber o nada acrescido ao seguinte brinde: a consciência de que sou outro heróico cidadão dominado pelo mesmo vilão. Gosto da saudade adiantada que vem se espalhando, do verde, do puro, do autêntico ouro, definhando em prol do falso tesouro, vil e vão, se acumulando. Gosto de nossa (Ausente!) educação, pois como já se dizia nos dias de alta filosofia: Bem-aventurados são os tolos, pois a ignorância é uma benção! Gosto do pensamento de que consigo gostar, já que atualmente tudo é indiferente, ninguém nada sente... Ou todos sentem o nada? Complexo como ver o desenho do ar... Gosto da sinfonia de buzinas orquestrada pela hora do pico, soando sobre rios estáticos de metal, em acordes de stress e uma pressa letal. É um grande espetáculo, há concerto mais rico? Gosto de apreciar a labuta vivida para se viver em labuta, enquanto se paga as parcelas do caro retrato, tudo por trás das cláusulas de um contrato. Eis o sentido da vida: se erguer e lutar para cair em outra luta. Mas o que eu mais gosto em tudo é falar às avessas... Você percebe agora, leitor, que caiu na arapuca de um ironista? Perdão se te iludo com essas cismas travessas, mas tudo me ignora, um horror, se eu sou sincero e simplista. Não me importa que desgoste de mim, após tal traição lhe encho de razão, mas se gostar desses meus gostos como eu gosto, novamente lhe direi, mas desta vez com gosto: Eu gosto deste leitor!

Sário Ferreira - 05 de maio de 2010


Escárnio

Prisão de carne
Mundo de desejos
Sujos cujos
Sussurros neblinam o ver
E lhe deixa a crer
Que não tem quem quer
Que não quer ter o quem
Quando o bestial e camaleônico querer
Aflora, estoura
Te separando de ser seu ser

Oh, amarga e doce dor de ver!
Ausente aos olhos
Presente do ardor

Tu resistes, amor?














Sário Ferreira